sexta-feira, 27 de abril de 2012

PF indicia 43 médicos em quatro estados por venda ilegal de botox Distribuidores, comerciantes e donos de clínicas também foram indiciados. Inquérito aponta 55 envolvidos, nos estados de PE, PB, PI, RN, SP e MG.


Cinquenta e cinco pessoas - entre elas 43 médicos - foram indiciadas em seis estados brasileiros pela Operação Narke, que apura denúncias de comercialização clandestina de toxina botulínica, o “botox”, usada para tratamentos estéticos e de saúde. A conclusão do inquérito foi apresentada nesta quinta-feira (26) pela Polícia Federal em Pernambuco. A operação foi feita em conjunto com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em oito estados brasileiros.

Segundo a PF, foram indiciados quatro distribuidores, oito comerciantes e 43 médicos e/ou proprietários de clínicas. São 28 médicos e três outras pessoas em Pernambuco; na Paraíba, onze pessoas, sendo dez médicos; três médicos em Teresina, no Piauí, e um médico em Natal, no Rio Grande do Norte. Em São Paulo, seis pessoas, entre elas um médico. Em Minas Gerais, uma pessoa foi presa. Os nomes não foram divulgados pela polícia. Eles responderão à Justiça por crime contra a saúde pública, crime contra a ordem tributária e a maioria deles também por crime de contrabando, cujas penas podem variar de 10 a 15 anos.

O inquérito foi concluído na última sexta-feira (20), após 17 dias da deflagração da operação, que buscou reprimir a comercialização clandestina de toxina botulínica do tipo "A". Segundo a PF, o produto era contrabandeado para o Brasil, sem fiscalização ou autorização de uso pela Anvisa, o que acarretava sério risco à saúde da população.

Toxinas ilegais foram apreendidas durante investigações (Foto: Divulgação / Polícia Federal)



A toxina botulínica do tipo A, além da aplicação estética, também é utilizada de forma terapêutica, inclusive para tratamento de disfunções neurológicas e motoras. A substância é classificada pela Anvisa como medicamento, sendo objeto de licitações para aplicação em estabelecimentos hospitalares da rede pública.


De acordo com a polícia, a Operação Narke desbaratou também a comercialização de outros produtos médicos, como metacrilato, cânulas e prótese de silicone, revendidos por estabelecimentos sem alvará sanitário.

Ao longo da investigação, a Polícia Federal apreendeu inúmeros produtos ilegais no cumprimento dos mandados de busca e apreensão judiciais e nas prisões em flagrantes. Os mandados judiciais foram contra distribuidores, profissionais de saúde e clínicas em João Pessoa (PB), Recife (PE), Belo Horizonte (MG), São Paulo (SP), Caruaru (PE), Patos (PB), Natal (RN), Teresina (PI), Aracaju (SE) e Maceió (AL). Cerca de 80 pessoas foram ouvidas, entre médicos, pacientes e outras testemunhas.

Foram identificados e indiciados quatro empresários, estabelecidos em São Paulo, apontados como distribuidores contrabandistas, e oito comerciantes que atuavam no recebimento e venda da carga contrabandeada junto aos médicos, clínicas e consultórios. Além disso, a Polícia Federal solicitou à Justiça que informasse ao Conselho Regional de Medicina de Pernambuco (Cremepe) e ao Conselho Federal de Medicina para que os médicos sejam responsabilizados também na esfera administrativa e ética.

Ainda segundo a PF, esse número de profissionais de saúde envolvidos pode aumentar, pois outros médicos serão intimados para prestarem esclarecimentos à Justiça. É que a análise do material apreendido durante a Operação Narke na casa dos alvos da investigação revelou outros clientes da toxina clandestina ou do metacrilato ilegalmente comercializados.

Como eles agiam?

Toxinas ilegais foram apreendidas durante
investigações (Foto: Divulgação / Polícia Federal)
As investigações apontaram que esses produtos eram adquiridos pelos médicos ou diretamente pelos pacientes por meio da indicação dos próprios médicos. A venda era feita em estabelecimentos desprovidos de licença dos órgãos de vigilância sanitária, sem condição de armazenamento e sem garantia da boa conservação, aquém das exigências da Anvisa em relação à rastreabilidade dos produtos médicos e biológicos.


Segundo a PF, a toxina clandestina entrava no Brasil de duas formas: por meio de empresários que praticavam o contrabando da toxina, comportamento conhecido como "mula" (viagens frequentes para o mesmo itinerário e por poucos dias) ou pela introdução da toxina contrabandeada misturada ou confundida com cargas de importação lícitas. A identificação da origem do medicamento contrabandeado para o país só poderá ser confirmada após o laudo conclusivo do Setor Técnico Científico (Setec) da Polícia Federal.


AlertaA Polícia Federal orienta aos pacientes a, antes de qualquer procedimento médico ou estético com a toxina botulínica, questionarem os médicos sobre o produto que será aplicado, verificando sua embalagem (normalmente as toxinas clandestinas não possuem qualquer identificação) a fim de se assegurarem de que o produto possui a autorização da Anvisa.
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PRF prende homem suspeito de transporte ilegal de carga em MG Segundo polícia, 15 toneladas de açúcar foram apreendidas com o motorista. Nota fiscal da carga tinha indícios de falsificação.



A Polícia Rodoviária Federal (PRF) prendeu em flagrante, na tarde desta quinta-feira (26), um motorista suspeito de transporte irregular de carga na BR-356, na altura do km 269, em Muriaé, na Região da Zona da Mata, em Minas Gerais. Com o homem de 28 anos, foram apreendidas 15 toneladas de açúcar e o caminhão em que o produto era transportado. De acordo com a corporação, o condutor apresentou uma nota fiscal com indícios de falsificação. Ele foi encaminhado à Delegacia de Polícia Civil de Muriaé. (Foto: Polícia Rodoviária Federal / Divulgação)

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SOCIALMENTE ACEITO Jogo do bicho foi ilegalizado por moral anacrônica Por João Pedro Pádua


Em vários filmes de fantasia, desses que envolvem dragões e outros tipos de bestas mitológicas, sempre existe um segredo atrás de uma grande e impressionante cachoeira. Ali pode estar a toca do dragão, a gruta que serve de casa para o heroi, o tesouro. O que quer que esteja ali, a cachoeira, com a sua imponência, com o jorrar da sua água vívida, teima em esconder.
Fiquei pensando nisso enquanto acompanhava (e continuo acompanhando) o jorrar de notícias, trechos de conversas telefônicas, documentos conseguidos com exclusividade (alguns ao arrepio do sigilo legal, por sinal), enfim, tudo e mais um pouco sobre “Carlinhos Cachoeira” e sua enorme rede de contatos e negócios. É mesmo irônico que o apelido desse personagem seja Cachoeira, porque, no caso dele, é justamente atrás desse jorrar de notícias e informações que se esconde o que é mais importante, mas que poucos parecem tentar encontrar.
O jogo do bicho faz parte da história do Brasil. Parece que ele nasceu mais ou menos junto com o primeiro Jardim Zoológico do Rio de Janeiro, no bairro de Vila Isabel, então de propriedade do nobre que o criou: o Barão de Drummond. Passou de um sorteio interno ao Zoológico para um jogo de apostas e assim ficou, mais ou menos inerme, até ser ilegalizado em 1941.
Decreto-Lei 3.688/1941, aprovado unilateralmente por um presidente-ditador sem Congresso funcionando, e apelidado de Lei de Contravenções Penais, tem um interessante capítulo, o capítulo VII da sua Parte Especial. É neste capítulo, dedicado às “contravenções relativas à polícia de costumes”, que figura o artigo 58: “Explorar ou realizar a loteria denominada jogo do bicho, ou praticar qualquer ato relativo à sua realização ou exploração”. Esse artigo é, na verdade, um tipo especial de proibição relativamente à proibição geral a jogos de azar contida no artigo 50.
A razão oficial para proibir o jogo do bicho e os jogos de azar em geral pode ser encontrada nosconsideranda de outro Decreto-Lei. O de 9.215/1946, que revogou a revogação do mencionado artigo 50, considerando, entre outras coisas, que “a repressão aos jogos de azar é um imperativo da consciência universal” e que “a tradição moral jurídica e religiosa do povo brasileiro e contrária à prática e à exploração e jogos de azar”.
Foi, portanto, sob essa justificativa claramente moralista (e hoje anacrônica) que o jogo do bicho passou de prática popular a ilícito penal. É bem verdade que a ilegalização do jogo do bicho não veio sob uma roupagem jurídica muito severa. Imagino que ninguém em 1940-41 tenha pensado em transformar o jogo do bicho em crime, punido com pena de reclusão ou detenção. Acharam por bem colocá-lo com um ilícito penal menor, uma contravenção, bem próxima de outras contravenções similares, tais como a vadiagem (artigo 59: “Entregar-se alguém habitualmente à ociosidade, sendo válido para o trabalho [...]”), a mendicância (artigo 60: “Mendigar, por ociosidade ou cupidez”; artigo revogado desde 2009), e a embriaguez pública (artigo 62: “Apresentar-se publicamente em estado de embriaguez, de modo que cause escândalo [...]”).
Foi também nesse contexto de moralismo anacrônico que se criaram as bases para que, muitas décadas depois, alguém como Carlinhos Cachoeira aparecesse, ficasse milionário, e, aparentemente, passasse a dominar a política do estado de Goiás, além de negócios no Brasil inteiro. Olhando para trás parece realmente incrível que um movimento tão inocente, movido por um chamamento da “consciência universal”, fizesse um estrago tão grande na política criminal brasileira.
Tornado ilegal, mas ainda parte da cultura popular, o jogo do bicho estava aberto a quem tivesse a logística criminal para monopolizá-lo. E, assim, aos poucos, fortunas foram feitas e famílias de exploradores do jogo do bicho criaram máfias dignas de histórias napolitanas ou sicilianas. Obviamente, já que o jogo era ilegal, as famílias monopolistas tinham de criar e manter uma rede de colaboradores, seguranças privados e agentes públicos corruptos, de modo que os pontos de apostas fossem divididos com o menor trauma possível, quer entre famílias, quer com o Estado. No belo romance “Agosto”, Rubem Fonseca retrata bem a penetração da polícia do Rio de Janeiro pela propina das famílias monopolistas do jogo do bicho. É claro que, naquela época, as drogas ainda não eram tão duramente ilegalizadas quanto se tornariam ao longo da segunda metade do século XX, quando elas tomaram o lugar do jogo do bicho como negócio ilegalizado mais lucrativo.
Essa configuração criminológica de tipo familiar/monopolista/mafioso fez com que as sucessivas gerações dessas famílias monopolistas acumulassem significativa riqueza. Essa riqueza tinha de ser escoada, lavada e contabilizada, para que pudesse gerar a moeda mais importante de uma sociedade capitalista-hierárquica como a brasileira: artigos de luxo. E daí vem empresas (de fachada ou não), laranjas, contas off shore e toda uma engenharia clandestina que procura tornar o bicheiro (um “contraventor” que atenta contra a “consciência universal”) em empresário (uma figura invejada e profícua, que consome e comanda).
Na busca por apagar a desvalorizada identidade de bicheiros, os membros das famílias monopolistas passam a investir em outras atividades sociais, que lhes rendam identidades valorizadas. É novamente irônico, neste ponto, que uma dessas atividades, seja o carnaval, especificamente o carnaval das escolas de samba do Rio de Janeiro. A ironia está em que uma atividade ilegalizada por conta da sua afronta a valores “morais, jurídicos e religiosos do povo brasileiro” busque refúgio simbólico justamente na atividade e momento social em que todos os valores moralistas e religiosos se encontram oficialmente suspensos no Brasil, com direito a autorização de nudez, sexo casual em público e outras heresias mais.
De qualquer modo, juntando a ilegalização de uma atividade culturalmente normal para o povo, com o consequente monopólio da atividade tornada ilegal, com a necessidade das famílias monopolistas do jogo do bicho de buscar identidades socialmente valorizadas, chegamos a Carlinhos Cachoeira. Ao que tudo indica, trata-se de uma pessoa que enriqueceu com o monopólio do jogo do bicho, monopólio que lhe foi fornecido pela ilegalização desta atividade, muitas décadas antes.
Cachoeira, no entanto, não queria (somente) ser o bicheiro, um pária social, mas o empresário, um membro da elite. Para isso, utilizou o dinheiro que o monopólio do bicho lhe deu para criar negócios, fazer amizades com políticos e (outros) empresários, financiar campanhas eleitorais. Enfim, tudo o que o seu dinheiro pôde comprar para que ele tivesse acesso ao bem mais valorizado nas relações cotidianas do Brasil: o contato com gente “poderosa”, “influente”.
A estratégia, também ao que parece, só não deu certo porque a marca de bicheiro é poderosa, e porque as instituições do Estado cismam em manter essa paradoxal relação com os monopolistas do jogo do bicho: milhões de reais em recursos públicos para investigar uma mera contravenção penal; milhões de reais em dinheiro do bicho para financiar carnavais, políticos e empresários. Um círculo vicioso que, como uma cachoeira, esconde o real problema: a insustentável ilegalização do jogo do bicho.

João Pedro Pádua é advogado, professor da Escola Superior da Advocacia (ESA-OAB/RJ) e da Faculdade de Direito da UFF, Doutorando em Estudos da Linguagem (PUC-RIO) e Mestre em Direito Constitucional e Teoria do Estado (PUC-RIO)
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RISCO DE VIDA D'Urso é contra PM cumprir pena em presídio comum


A proposta de que policiais militares cumpram pena em presídios comuns, apresentada durante a cerimônia de posse do novo comandante-geral da Polícia Militar de São Paulo, coronel Roberval Ferreira França, na última terça-feira (24/4), contrariou o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, em São Paulo, Luiz Flávio Borges D’Urso
O presidente da OAB-SP explica que um policial condenado, mesmo que expulso da corporação, se fosse cumprir sua pena em uma unidade prisional comum estaria correndo altíssimo risco de vida. “Seria um gravame acrescentado à sua punição, o que é totalmente ilegal. A proposta, portanto, não tem embasamento na legislação brasileira e nem se justificaria a mudança da lei”, garante D’Urso.
“As condenações no âmbito criminal para todos os presos, policiais militares ou não, consistem na supressão da liberdade, sendo que o Estado deve assegurar a saúde, alimentação e integridade física desses condenados. Para algumas categorias profissionais fica assegurado acesso à prisão diferenciada, seja para cumprir pena provisória ou definitiva. Isso não significa privilégio ou favorecimento. Pelo contrário, é uma garantia de que todos os presos só devem ter a supressão da liberdade, limite da punição prevista em lei” afirma D’Urso. Com informações da Assessoria de Imprensa da OAB-SP.
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CAUSA E EFEITO Procurador critica súmula das algemas e elogia PF Por Marcelo Auler


Na abertura oficial do V Congresso Nacional dos Delegados de Polícia Federal, na noite de quarta-feira (25/4), no Rio de Janeiro, os tribunais superiores, em especial o Supremo Tribunal Federal, tornaram-se alvo das principais críticas. A maior delas partiu do procurador de Justiça de Minas Gerais, Rogério Greco, para quem ao editar a Súmula nº 11, o STF mostrou “desconhecer completamente a realidade". A súmula trata dos limites para o uso de algemas.
"É não entender como funciona a Polícia. Um tribunal que edita uma súmula vinculante destas, regulamentando — entre aspas — o emprego de algemas, nunca conheceu as ruas, o cara nunca andou de ônibus, não sabe o que é o cheiro de sovaco. Não entende como é que funciona o Tribunal do Júri”, disse ele.
Professor, estudioso do Direito Penal e autor de diversos livros a respeito, Greco classificou a súmula de hipócrita e relacionou sua edição ao trabalho dos policiais federais nas últimas grandes operações. “Não tem súmula mais hipócrita do que a Súmula Vinculante nº 11. Foi por causa de vocês que ela foi editada. Vocês foram responsáveis. Engraçado, desde que o Brasil foi descoberto em 1500, ninguém nunca se preocupou com o uso de algemas. Era argola no pescoço do negro, nos pés, nas mãos e ninguém nunca se preocupou. No dia em que a pulseira de ouro foi transformada em pulseira de aço, aí a casa caiu. O dia em que a Polícia Federal começou, brilhantemente, a meter o grampo em todo mundo de classe média e média alta, isto é novidade, não acontecia”.
Para ele, as algemas em acusados de crimes financeiros tinham um segundo significado. “Eu via aquilo meio como um desabafo. Quando aqueles caras importantes, entre aspas, que importância não tem nenhuma, são verdadeiros genocidas, o dia em que estes caras começaram a ser presos...Imagina o Maluf sendo algemado. Eu vibrei com o Maluf sendo algemado...O fato de meter o grampo, de meter a algema no Maluf era meio — eu via em vocês, posso estar até falando bobagem — mas eu via meio como um desabafo. Sabe aquele negócio: cansei de botar grampo em “nego” arrebentado no meio da favela, agora você vai tomar o grampo também? Isto, para mim, era um espetáculo, ver aqueles caras colocando um casaquinho por cima da algema, com a cabecinha baixa, igual a um periquito quase quebrado”.
Ainda que de forma mais moderada, o novo presidente nacional da Associação dos Delegados de Polícia Federal, delegado Marcos Leôncio Souza Ribeiro, empossado no último dia 20 de abril, em entrevista à revista Consultor Jurídico, também teceu crítica aos tribunais superiores ao descrever o atual papel da Polícia Federal. Ele fez votos que eles evoluam nos seus atuais entendimentos.
“O papel da Polícia Federal é respeitar este nível de evolução do Judiciário brasileiro, se aprimorar cada vez mais para se adaptar e evitar nulidades processuais. Fortalecer a prova técnica e esperar, quiçá, um dia, que o nosso Judiciário acompanhe a evolução que outros países já conseguiram. O Judiciário brasileiro passa pelo mesmo processo que outros países passaram. A Polícia Federal brasileira passa pelas mesmas dificuldades que as polícias do mundo mais desenvolvido passaram, que é este momento de transição entre a verdadeira busca da prova técnica, sem tanto garantismo, sem tantas interpretações exacerbadas da norma garantista”.
Ideologia
Curiosamente, na abertura do Congresso não havia representante do Ministério Público Federal. Um procurador da República disse que membros do MPF não foram convidados. Leôncio menosprezou os chamados desentendimentos que ocorrem entre Polícia Federal e Ministério Público, realçando que quando ocorrem é muito mais no campo doutrinário do que na prática do trabalho do dia a dia. Para ele, o entendimento também ocorre na primeira e na segunda instância do Judiciário Federal, mas ainda não acontece com os tribunais superiores, classificado como “mais ideológicos”.
“Por incrível que pareça existem mais disputas no campo ideológico/político/classista do que no ponto de vista institucional. Ministério Público Federal e Polícia Federal, do ponto de vista institucional e operacional, se entendem muito bem. Nas operações a relação é boa, a relação é boa com a Justiça Federal de primeira instância e de segunda instância. Temos, talvez, com os tribunais superiores — por serem tribunais muito mais ideológicos, de tese, do que tribunais de instrução, de apuração de fatos —, temos esta dificuldade. Mas, acredito que vai evoluir com o tempo. Do ponto de vista destas bandeiras de disputas, como do poder da investigação, são muito mais no campo ideológico do que pragmático. Na prática, Polícia Federal e Ministério Público Federal até que tem uma sintonia fina em questões que envolvem o combate ao crime organizado. Também com a Justiça Federal, principalmente em primeira e segunda instância”.
As questões que lavaram os tribunais superiores a anularem algumas das principais operações policiais por nulidade de provas não mereceu maior atenção na abertura do Congresso. Nem mesmo o desembargador federal Messod Azulay Neto — um dos três representantes da Justiça Federal presentes à cerimônia —, que foi o primeiro palestrante da noite, teceu comentário a respeito. Antes, pelo contrário, enalteceu o trabalho da Polícia Federal.
Para ele, fundamental, “tanto quanto, ou mais ainda do que, a descoberta de polos de riquezas ou a exploração por produção de bens, é permitir que estes bens e estas riquezas possam fluir, possam trilhar por caminhos desobstruídos e alcançarem os seus objetivos. E esta, em última análise, tem sido a árdua tarefa da Polícia Federal do Brasil. É importante que se diga que não se faz uma Justiça Criminal sem uma polícia judiciária estruturada, bem remunerada e orgulhosa das suas condições. Há um ditado popular que diz que um bom exemplo vale mais do que mil palavras e eu acredito que, principalmente nesta última década, a Polícia Federal tem dado mostras, tem dado mais do que um exemplo, de que a excelência do seu trabalho se compara as maiores instituições de polícias judiciárias do mundo, se igualando à tão famosa israelense, americana, londrina, etc.”.
Escutas telefônicas
Azulay Neto destacou apenas a necessidade de os policiais federais cuidarem melhor das escutas telefônicas que hoje tem gerado inúmeras queixas por parte dos advogados de defesa os quais, como disse ele à revista ConJur, ao questionarem “nulidades em cima de questiúnculas processuais”, fazem o trabalho deles. E iss, segundo ele, exige “maior atenção dos policiais”.
Estes ataques, segundo disse, acontecem “através de Habeas Corpus e recursos de toda a ordem. Seja pelo fato de que as escutas são deficientes, seja por excesso de prazo, seja porque não serem disponibilizadas na íntegra para a defesa, seja porque as transcrições também são deficientes, enfim por várias razões. O que ocorre é que tanto na segunda instância, nos tribunais superiores e mesmo no Supremo Tribunal Federal, em alguns casos, eu não diria que isto é uma coisa constante, a prova acaba sendo anulada”. Ele disse: “Nós julgamos com sentimento de que alguma coisa foi perdida no meio de tanta coisa, o trabalho de anos da Polícia Federal sendo todo jogado por terra”.
Em entrevista à ConJur, ele explicou que são problemas que com o próprio desenvolvimento de suas atividades vão sendo corrigidos aos poucos. "Eu procuro exaltar o trabalho de Polícia Federal e eu acho que ele tem que ser exaltado mesmo”.
Na palestra, ressaltou que esta questão “nem chega a macular todo o trabalho que é feito. Muito ao contrário, a Polícia Federal, na desenvoltura de seus trabalhos, tem servido até para modificar e criar instrumentos processuais – eu citaria o caso do Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal (MLAT) entre o Brasil e os Estados Unidos da América, aprovado pelo Decreto nº 3.810/01”.
Explicou que “a agilidade, o dinamismo, a velocidade da Polícia Federal e das polícias judiciárias de todo o mundo ocidental, avançado e evoluído, tem provocado tamanho dinamismo nas investigações que as Cartas Rogatórias que seriam os instrumentos adequados para um país se comunicar com o outro não foram suficientes para atender ou para acompanhar a velocidade investigativa que a polícia investigativa, que a Polícia Federal e a Polícia Civil têm imprimido aos seus trabalhos”.
Comando da investigação
No único ponto em que a discordância entre os dois palestrantes — o desembargador federal e o procurador de Justiça — poderia aparecer, acabou, de certa forma, havendo confluência de pensamento. Azulay Neto, embora ressaltando o direito do Ministério Público em fazer investigações, defendeu a tese de que a lei não lhe permite contudo presidir inquéritos policiais, atividade típica da autoridade policial.
“O Ministério Público não foi contemplado neste sentido com uma lei que permitisse presidir inquérito. Uma coisa é produzir atos investigativos. Isto qualquer um pode, o MP também pode, nos limites da lei, nos limites da Lei de Organização do Ministério Público, a LOMP, que o autoriza, inclusive, a requisitar documentos, a proceder a oitiva de testemunhas. Não há nenhum vicio nisto, nada de errado nisto. Mas presidir para mim, tenho que não”.
Segundo ele, não há duvida de que esta tarefa cabe às autoridades policiais, “porque há atos investigativos que são privativos da autoridade policial. Por exemplo, se o Ministério Público Federal — que é aquilo que nos diz respeito — instaura um procedimento administrativo investigativo e durante as investigações resolve nomear um perito, não é possível. A lei não autoriza que a nomeação de perito seja feita pelo MP. Ela só pode ser feita pela autoridade policial. Outro exemplo, a escuta telefônica. Admitamos que o Ministério Público Federal ou estadual entenda que deva se proceder a uma escuta telefônica, ele terá que solicitar à autoridade judicial e, deferida, a lei é expressa no sentido que quem supervisiona, acompanha e executa é a autoridade policial. Se durante uma investigação o MP entender que casos como estes e outros, atos investigativos devam ser executados ele deverá remeter o requerimento à autoridade policial que deverá presidir o inquérito até o seu termo final”.
Greco, ao comentar tais questões, deixou claro que o MP — em especial o de Minas Gerais, onde atua — não pretende presidir inquéritos, mas sim ter garantias da continuidade da investigação sem possíveis interferências externas.
“Por que em muitas situações o Ministério Público investiga? Porque os policiais, os delegados de polícia não têm as garantias que o MP tem. Isto pode ser que não aconteça com a Polícia Federal, mas nas polícias estaduais — digo isto pelo meu Estado — o delegado pode estar fazendo uma investigação brilhante, espetacular, aquele trabalho perfeito. Infelizmente — no meu estado ainda acontece — um telefonema e no dia seguinte a investigação acabou e aquele delegado de polícia que estavam em Belo Horizonte vai lá para Unaí, vai para Caxambu, vai para caixa prego, mas a investigação acabou”.
Baseado nisto é que defendeu que os delegados briguem pelas mesmas garantias — inamovibilidade, irredutibilidade de vencimentos — que a Constituição de 88 deu ao Ministério Público. “Acho que a Polícia Federal, principalmente os delegados da Polícia Federal, tem que brigar por isto, por garantias. O dia que a polícia tiver as mesmas garantias do MP, da magistratura, aí o papo é outro, aí muda”, concluiu. 

Marcelo Auler é jornalista.

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