terça-feira, 3 de abril de 2012

Drogas não respeitam limites em Belo Horizonte


Belo Horizonte, sexta cidade do país em população, com 2,3 milhões de habitantes, está dominada pelo crack e outros entorpecentes. Há pelo menos uma boca de fumo em cada um dos 274 bairros. A estimativa não é oficial, mas fica evidenciada nas ocorrências policiais e na experiência de instituições e organizações não governamentais que tentam livrar as pessoas do flagelo das drogas.

Nos bairros de classe média e alta, as bocas funcionam em locais insuspeitos, como apartamentos e casas, onde há drogas caras, como ecstasy, cocaína, além de maconha. As drogas vão para clientes cadastrados, que recebem em casa, atendidos pelo “disque-droga”. Mas o crack também já ronda os ambientes dos mais abastados.

Nas 208 vilas, favelas e conjuntos habitacionais populares, praticamente em cada esquina há uma “cracolândia”. Traficantes e usuários de drogas convivem durante 24 horas. Embora exista a oferta de cocaína e maconha, o crack domina o comércio. A pedra é vendida de R$ 5 a R$ 10.

Hoje em Dia percorreu as “esquinas do crack” de Belo Horizonte, no Centro e em vários bairros e favelas, para constatar o poder devastador da droga e o seu livre consumo. A realidade encontrada é de muitos dependentes que clamam por ajuda. Muitos reclamaram que procuraram o “SOS Drogas”, órgão ligado à Subsecretaria de Estado de Políticas sobre Drogas (Supod) e não conseguiram abrigo. Hoje, se as autoridades sanitárias quiserem resgatar uma legião de viciados é só seguir o roteiro percorrido pela reportagem.


Na Pedreira Prado Lopes, na região Noroeste, a situação está fora de controle. Na esquina das ruas Araribá e Marcazita, viciados, sujos e maltrapilhos, atuam como “olheiros” para os traficantes em troca de uma pedra de crack. Questionados se querem tratamento, eles praticamente imploram por ajuda. Um “soldado do tráfico” chegou a reclamar com a equipe do Hoje em Dia, dizendo que era para “marcar outra hora” para falar com aquelas pessoas, pois “estavam trabalhando”. A função delas é observar se a polícia aparece e avisar. Durante o tempo em que a reportagem esteve no local, cerca de uma hora, nenhuma viatura da polícia passou.

Um dos homens, F., de 32 anos, muito sujo e com os pés encardidos, revelou ser natural de Campinas (SP). Ansioso, com medo de ser repreendido pelos traficantes e deixar de receber sua pedra como pagamento, contou ter trabalhado como técnico agrícola e motorista, e que tem um filho que é jogador do Santos Futebol Clube. Ele disse que começou a fumar crack em São Paulo, onde havia feito tratamento. “Eu estava limpo. Há dois anos, vim fazer um frete para BH e acabei na Pedreira, onde fumei uma pedra. Estou aqui até hoje. Preciso muito de ajuda”. Outro homem, L., de 34 anos, disse que é viciado há dez anos. Também pediu por uma chance de tratamento.

Na Avenida José Bonifácio, a poucos metros do Departamento de Investigações da Polícia Civil, o comércio e o consumo de drogas também acontecem livremente. Ao longo da via, os viciados montaram cabaninhas de plástico onde fumam o crack. Um homem sujo, sem dentes, sai de lá, alterado. “Não quero tratamento p... nenhuma. Quero ficar louco, louco”, gritou, com agressividade.

Com o anoitecer, as atividades, tanto de tráfico quanto de consumo, aumentam. Na Rua Araribá, uma legião de “zumbis” formada por jovens, idosos, mulheres e até crianças acendem seus cachimbos todo o tempo. Ninguém parece se importar com mais nada. Na esquina com a avenida Antônio Carlos, policiais militares em um Posto de Observação e Vigilância (POV) assistem, de longe, a degradação humana. “Não adianta. Não é caso de polícia mas, sim, de saúde pública. Essas pessoas precisam é de tratamento, não de cadeia”, diz um policial.

Numa praça no bairro Carlos Prates, o pintor M., de 36 anos, morador de rua, se declara viciado em crack desde os 16 anos. Ele refuta qualquer ajuda. “Já estive internado três vezes. Não acredito nessa forma de tratamento. Eles só ficam humilhando a gente. Para quem não é viciado é muito fácil julgar. Por isso, não quero ir mais”, afirma.

T. de 25 anos, revela que é viciado desde os 17. “Já experimentei de tudo, até heroína. Mas hoje estou na perdição da pedra”. Ele revela que tinha R$ 30 mil para montar uma padaria, mas gastou tudo com drogas. “Fiquei 16 dias sem dormir, só fumando”. Abandonado pela mulher, com quem tem um filho, decidiu ficar na rua, “Preciso de uma oportunidade de me tratar. Me ajude por favor”, implora.

Relatos como esses poderiam encher uma página. A situação é a mesma em outras áreas visitadas, como o Alto Vera Cruz e a Sagrada Família, na região Leste, nas imediações da avenida Pedro II, na Lagoinha (Noroeste), na esquina das ruas Tamoios e Rio de janeiro e imediações da Praça da Estação e da Serraria Souza Pinto, no Centro.

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