Pequenos contras e muitos prós ao anteprojeto de Novo Código Penal, e toda uma torcida para que o
trabalho de uma comissão de mestres não seja desfigurado pelo caminho até a sua aprovação.
Sobre o anteprojeto de elaboração de um novo Código Penal brasileiro a ser apresentado ao Senado não há dúvida: está sendo preparado por renomados juristas, tendo à frente, como presidente da comissão, o Ministro Gilson Dipp, alguém que conhece como poucos a nossa legislação, tanto a doutrina como a prática.
Entendo que a grande dificuldade será fazer com que os acordos políticos não "estraguem" o anteprojeto tão cuidadosamente elaborado. A começar pela grande dificuldade ao tratar, numa legislação como essa, da proporcionalidade que deve existir entre a importância dada aos crimes e as penas aplicadas. É a questão central que determinará os tipos legais (descrição do crime) e as penas aplicadas a cada crime (para crimes mais graves, penas mais graves e, para crimes menos graves. penas menores).
Essa aparente lógica pode ser facilmente rompida com modificações pontuais no anteprojeto. No entanto, cabe ao Congresso tratar com cuidado e parcimônia as eventuais modificações, para não romper a lógica adotada pelos ilustres juristas que compõem a comissão.
O anteprojeto, de fato, como o descrito e apresentado na excelente entrevista do Ministro Dipp àConsultor Jurídico, modernizará nossa legislação. Mas também é verdade que muitas das mudanças dependerão menos da vontade dos técnicos e mais de tratar-se de um avanço social. A questão do aborto, por exemplo, tem seu tratamento penal "preso", atado de certa forma à evolução social com relação ao tema. Mas essas modificações, ao tratamento dado ao tema, assim como o relacionado à eutanásia e à ortotanásia avançam em nossa legislação.
Outra questão que vem sendo tratada de forma evoluída é a do dependente de entorpecentes, deixando claro que o viciado é, de certa forma, vítima (deve ser tratado como doente), diferenciando-o, assim, do traficante.
Contudo, ao analisar a proposta no que tange ao tema "terrorismo", devo expressar meu receio e dúvida sobre a necessidade de tal figura em nosso ordenamento jurídico. Ainda que totalmente bem intencionados os nossos juristas, não se pode negar que há grande risco de uma má interpretação. O que me levaria, talvez, a opinar pela sua exclusão. Considerando, claro, que esse não é exatamente um problema de relevância para o país, se estou bem informado sobre a inexistência de ameaças.
Pelo que pude perceber, ainda, a pena máxima será mantida em 30 anos, o que me parece bastante pertinente. Mas, se pudesse sugerir algo nesse sentido seria na direção de diminuir - e não de aumentar ainda mais - esse patamar. Conforme o ministro diz, há um clamor público que chega a eles pelo endurecimento das penas.
Qualquer pessoa que conheça a nossa realidade carcerária sabe que ali pouco significa muito. Aqui, cabe ressaltar a sabedoria das palavras do Ministro Dipp: aumento de pena não garante punição. O problema está na sensação de impunidade e não no quanto numérico da pena. Reconheço, contudo que, diante de todas as pressões existentes, manter como está, 30 anos, já será um grande passo.
Contudo, há um ponto sobre o qual não poderia deixar de me manifestar, com opinião pessoal (contrária, diga-se de passagem): diz respeito à responsabilidade da pessoa jurídica. Acredito que dentro do atual ordenamento jurídico - pautado na culpabilidade - é impossível
trabalhar com o conceito da responsabilidade da pessoa jurídica. Para tanto, seria necessário modificar todo o nosso ordenamento. Será um longo debate, e se não for liberado de todo esse conteúdo positivo proposto pela Comissão, para ser discutido em outra ocasião e mais bem amadurecido, trará o risco de inviabilizar a aprovação do anteprojeto.
Por fim, não posso deixar de aplaudir e ao mesmo tempo lamentar a sugestão da criação de tipos penais para a autoridade que desrespeitar o exercício profissional do advogado. Aplaudir, em razão dos abundantes casos de desrespeito profissional, hoje uma infeliz rotina do advogado, principalmente no interior desse rico país. Mas lamentar, por ser muito triste viver em um lugar, num país que se roga moderno e democrático, e que ainda precise desse tipo de legislação para manter o respeito aos advogados.
Melhor seria que não precisássemos de tais leis; mas se elas são necessárias para assegurar nosso respeito que venham. O que não podemos é continuar como estamos.
Desejo mesmo muita sorte a toda a comissão, e que o anteprojeto seja aprovado sem sobressaltos. Tenho a certeza de que os juristas que a compõem, liderados pelo Ministro Gilson Dipp, estão procurando fazer o que há de melhor para todos nós, cidadãos. Essas mudanças chegarão em boa hora, e devem acompanhar o desenvolvimento nacional que projetamos para o país.
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