sexta-feira, 30 de março de 2012

DIREITOS HUMANOS Brasil é pressionado para investigar morte de Herzog Por Marcelo Auler


O governo brasileiro está às voltas com nova pressão internacional pela apuração das condições em que morreu o jornalista Vladimir Herzog, o Vlado, dentro de uma cela do extinto Doi-Codi – órgão de repressão política na ditadura militar – em 25 de outubro de 1975.
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), acatando denuncia de diversas organizações de defesa dos Direitos Humanos no Brasil e o próprio Instituto Vladimir Herzog, instaurou um procedimento para investigar o comportamento do governo brasileiro em relação à morte do jornalista da TV Cultura.
O primeiro passo já foi dado: a comunicação ao governo de que o processo foi instaurado para que ele se manifeste. Foi o mesmo que aconteceu com a denúncia relacionada às mortes de guerrilheiros no Araguaia. Depois de um processo na CIDH, também a partir de denuncias das mesmas organizações, o caso foi remetido à Corte Interamericana de Direitos Humanos que condenou o governo e exigiu a apuração dos responsáveis pelas torturas e assassinatos dos guerrilheiros com suas respectivas punições.
A denúncia à CIDH partiu do Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL), da Fundação Interamericana de Defesa dos Direitos Humanos (FIDDH), do Grupo Tortura Nunca Mais de São Paulo, e do Centro Santo Dias de Direitos Humanos da Arquidiocese de São Paulo. Todas elas, em nota conjunta, consideraram que a “notificação chega em um momento fundamental ao conhecimento do Estado brasileiro, quando os órgãos competentes são chamados a tomar decisões que podem assegurar a manutenção do Estado Democrático de Direito, e a garantia da consolidação da democracia no Brasil”
Segundo a nota, a não apuração da morte de Vlado “é mais um exemplo da omissão do Estado brasileiro na realização de justiça dos crimes da ditadura militar cometidos por agentes públicos e privados”. Internamente, as pressões para que os governos pós-ditadura militar apurassem os responsáveis pelo assassinato não deram resultados concretos.
A única investigação foi a feita em um Inquérito Policial Militar, logo após o assassinato do jornalista, que concluiu pela tese inverossímil do suicídio. Esta versão, contudo, acabou rejeitada pela Justiça Federal, através de uma Ação Civil Declaratória proposta, em 1976, pela viúva Clarice e demais familiares, na qual foi reconhecido que houve o assassinato de um preso sob a responsabilidade do estado.
Em 1992, o Ministério Público do Estado de São Paulo tentou novamente abrir investigações, através de um novo inquérito. A medida, porém, foi barrada pelo Tribunal de Justiça com base na Lei de Anistia. Em 2008, como lembra a nota das entidades, respaldada em fatos novos, foi feita outra tentativa para iniciar o processo penal contra os responsáveis pelas violações cometidas. Desta feita o arquivamento do caso foi provocado sob a alegação da prescrição do crime.
Entre a abertura do caso pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos e um julgamento pela Corte Interamericana de Direitos Humanos há um longo caminho a ser percorrido. Mas, tudo indica que o caso chegará aos magistrados da corte, pois já existe jurisprudência firmada com relação à necessidade de o Estado apurar e punir os responsáveis pelos crimes cometidos durante o regime militar.
Como lembra a nota divulgada nesta quinta-feira, apesar de a decisão da CIDH ter sido tomada terça-feira (27), a jurisprudência naquela Corte Interamericana diz serem “inadmissíveis as disposições de anistia, as disposições de prescrição e o estabelecimento de excludentes de responsabilidade, que pretendam impedir a investigação e punição dos responsáveis por graves violações dos direitos humanos, como a tortura, as execuções sumárias, extrajudiciais ou arbitrárias, e os desaparecimentos forçados”.
As entidades destacam no comunicado que a “notificação é uma clara mensagem da Comissão Interamericana ao Supremo Tribunal Federal de que novos casos sobre a dívida histórica seguirão sendo analisados pelos órgãos do sistema interamericano — Comissão e Corte Interamericanas de Direitos Humanos — na expectativa de que o Poder Judiciário se antecipe e cumpra a atribuição que lhe compete de fazer o controle de convencionalidade, adequando as decisões judiciais internas à Convenção Americana sobre Direitos Humanos, e consequentemente realize a justiça conforme as obrigações internacionais que o Estado brasileiro se comprometeu de boa-fé”.
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